LIRA SANTANA DE SIMÃO DIAS/SE

terça-feira, 25 de agosto de 2009

BANDAS FILARMÔNICAS

Bandas Filarmônicas: baluarte da cultura musical sergipana
Texto: João Liberato (Flautista e mestre em música - UFBA)

A banda filarmônica é um modelo de conjunto musical que ainda prolifera em várias regiões do país. Estas instituições costumam situar-se não só como forma de entretenimento e encontro social, mas também como importantes veículos da instrução musical. No entanto, muitas corporações musicais deste tipo sucumbiram, não mais fazendo parte da vida cultural. Diversos fatores contribuíram para o desaparecimento e a continuidade da atividade de bandas filarmônicas, sendo que o aspecto central que motiva a vida ou morte destas instituições é a função que desempenham na comunidade a que pertencem. As diversas mudanças ocorridas na sociedade brasileira forçaram as bandas filarmônicas a metamorfosearem-se, na busca pela sobrevivência diante das adversidades impostas pelo tempo. Sua origem no Brasil remonta ao final do séc. XVIII, nas bandas militares. Estes conjuntos sofreram diversas transformações ao longo da história. Um dos mais importantes impulsos foi a chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil, no ano de 1808, acompanhada da Banda da Brigada Real, que passou a estabelecer novos parâmetros musicais e simbólicos na produção de música instrumental no Brasil. Estas bandas militares costumavam tomar parte nas festas oficiais da monarquia luso-brasileira, tanto em honra à Família Real Portuguesa – aniversários, noivados, casamentos, batizados etc – quanto por razões de Estado – aclamações, vitórias militares e celebrações cívico-políticas em geral. Esta utilização permitiu a divulgação deste tipo característico de conjunto instrumental como um importante elemento simbólico na representação monárquica. As bandas filarmônicas eram uma forma de adaptação ou reapropriação desse símbolo sonoro desempenhado pelas bandas militares, que tinham participação em grande parte das cerimônias da monarquia. Esses rituais simbólicos foram se sedimentando na sociedade brasileira ao longo do séc. XIX, fazendo com que surgissem bandas filarmônicas em diversos centros urbanos e até em regiões remotas do país. Em muitos casos, estas bandas filarmônicas estavam no centro da vida cultural e política da cidade a que pertenciam. Interpretavam tanto a música da moda (valsas, polcas, maxixes, dobrados e árias de ópera) quanto faziam moda musical. Seus compositores rendiam homenagens às datas cívicas mais importantes, à sua cidade e aos mais destacados membros da sociedade. Elas abrilhantavam as festas religiosas, as comemorações políticas, as datas importantes e também comoviam a população nas exéquias daqueles que tinham prestígio para tal. A maior peculiaridade quanto à função das bandas filarmônicas no passado é o fato de algumas destas corporações terem desempenhado um papel político importante. Estas bandas constituíam-se em agremiações sociais intimamente ligadas a política. Após a deposição de Dom Pedro II e conseqüente proclamação da república, tem início um embate entre as diversas lideranças brasileiras que almejavam o poder político. Essa luta pelo poder político nos estados leva o país a um clima de extrema rivalidade política, onde os conflitos armados são constantes e boa parte da sociedade encontra-se envolta nesse clima de instabilidade e partidarismo extremado. Era neste contexto que as bandas filarmônicas tinham que se situar. Geralmente estavam sob a égide de um líder político (um coronel) a quem deviam lealdade. Elas se mesclavam com os partidos, pois a bipolaridade política pós-monarquia geralmente se materializava também em duas filarmônicas, a “de cima” e a “de baixo”, a de São Sebastião e a de Santa Cecília, a de Santo Antônio e a de Nossa Senhora da Conceição. Esta realidade era bem evidente em Sergipe. O trecho a seguir, retirado do jornal Folha de Sergipe, com data de primeiro de novembro de 1908, dá uma pequena mostra desta relação política: “Aos seos primeiros arreboés a sympathica philarmonica S. Antonio tocou alvorada em frente a residência do circunspecto Ex. sr. dr. Manoel Baptista Itajahy, digníssimo Vice-Presidente do Estado e Chefe deste município, sahindo depois em passeiata [...] Em casa do sr. coronel Dultra Almeida foram erguidas enthusiasticas saudações; foi servido fino vermouth e após a philarmonica executar lindas peças de seu vastíssimo repertorio, a multidão desfilou [...] Muitas foram as casas vizitadas e em todas a mesma festa, o mesmo delírio [...] O orador foi estrepitosamente saudado. Eram doze horas voltaram todos à sede da philarmonica e ao toque do Hymno Nacional a multidão despersou na melhor ordem, todos jubilosos.”[sic] No entanto, estes acontecimentos compõem apenas uma pequena parte da história destas instituições musicais. As bandas filarmônicas tiveram um papel fundamental não só na construção da cultura musical sergipana, mas também na construção da cultura política e social. Na realidade musical brasileira, uma banda de música desponta como um baluarte, como um exemplo vivo de sucesso musical, revelando – através do estudo histórico – problemas e soluções para instituições congêneres, apontando caminhos para o entendimento e desenvolvimento da atividade musical no Brasil. Ao lançarmos um olhar sobre estas instituições no presente torna-se imprescindível uma conexão com o passado. É o caminho necessário para entender o fenômeno do surgimento, da sobrevivência e do futuro dessas corporações musicais. Indicações bibliográficas: Liberato, João. Filarmônica Nossa Senhora da Conceição: funções de uma banda de música no agreste sergipano no período entre 1898 e 1915. Bahia: UFBA – Dissertação de Mestrado, 2008; Binder, Fernando Pereira. Bandas Militares no Brasil: difusão e organização entre 1808-1889. São Paulo: UNESP - Dissertação de Mestrado, 2006; Schwebel, Horst Karl. Bandas Filarmônicas e Mestres da Bahia. Salvador: Centro de Estudos Baianos da Universidade Federal a Bahia, 1987.

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